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NO INQUÉRITO POLICIAL O ADVOGADO NÃO ATUA COMO MERO ESPECTADOR DE ACUSAÇÕES PENAIS INJUSTAS

O inquérito policial como suporte probatório, anterior ao ajuizamento da ação penal de conhecimento, é, de ordinário, logrado mediante persecução ou apuração prévia à instauração da ação penal, e legalmente estruturada sob formas diversas, variáveis conforme o instante histórico, político e social de determinado Estado.

Em duas ponderáveis razões de ser repousa, dessarte, a persecução penal preliminar.

Primeiro, ostenta função preservadora, consistente em “preservar a inocência contra acusações infundadas e o organismo judiciário contra o custo e a inutilidade em que estas redundariam”, propiciando sólida “base e elementos para a propositura e exercício da ação penal”.

Assim, por mais perspicaz e circunspecta, a autoridade que dirige a investigação inicial, quando ainda perdura o alarma provocado pelo crime, está sujeita a equívocos ou falsos juízos a priori, ou a sugestões tendenciosas.

Neste esteio, ao lado da Policia Judiciária que detém a competência para investigar e do Ministério Público para fiscalizar, também estão em jogo os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, devendo ser observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição”.

Portanto, o exercício da atuação do advogado criminalista não repousa somente durante ação penal como querem fazer crer alguns, mas também, durante a investigação policial, pois o advogado, não pode se manter na posição de mero espectador das investigações desenvolvidas pela polícia judiciária, como se o inquérito policial; consistisse apenas de base para acusações legítimas, ou, como se não houvesse investidas ilegais contra o cidadão de bem.

O inquérito é também suporte para advogado criminal requerer o arquivamento do procedimento investigatório, quando se verifique sejam ineficazes as provas reunidas, quanto à existência do fato ou definição da autoria, ou logo demonstrem que o fato é inexistente ou atípico, ou, ainda, que há causa de exclusão da antijuridicidade ou de extinção da punibilidade, e, nesses termos, caracteriza poderoso instrumento de defesa e de tutela de direitos fundamentais, na medida em que, em muitos desses casos, a obrigatória decisão judicial de arquivamento é coberta por res iudicata material.

 JOAQUIM CANUTO MENDES DE ALMEIDA:

“A instrução preliminar é uma ‘instituição indispensável à justiça penal’. Seu primeiro benefício é ‘proteger o inculpado’. Dá à defesa a faculdade de dissipar as suspeitas, de combater os indícios, de explicar os fatos e de destruir a prevenção no nascedouro; propicia-lhe meios de desvendar prontamente a mentira e de evitar o constrangimento da investigação e a escandalosa publicidade do julgamento.

Assim, salvo as diligências em curso dotadas de segredo absoluto que pode frustrar a investigação policial, todas as demais provas, sejam de pesquisas, investigações, testemunhos e demais diligências já cumpridas pela autoridade policial devem ser disponibilizadas a defesa do investigado, como meio, ainda que diferido, do exercício do contraditório para eventualmente pugnar pela inobservância da verdade real e por rumos arenosos que eventualmente possa constatar.

Em muitos casos, tanto a investigação criminal, como o próprio processo penal, todavia, estão em jogo, em relação ao acusado, especificamente a liberdade física, vista como um dos mais importantes e sensíveis direitos da personalidade.

Em dias atuais a presença maciça deferimentos de medidas cautelares no bojo do inquérito policial implica ao investigado pesadas consequências, assim do ponto de vista prático, como teórico.

A despeito da garantia constitucional da proibição de prévia consideração de culpabilidade, a só pendência, por exemplo de uma Busca apreensão, de quebra de sigilo telefônico e da própria prisão preventiva durante o curso das investigações representam sempre, do ângulo empírico, perante a sociedade, um estigma, um sinal infamante, reconhecido como tal não apenas por preconceito.

Com efeito, até mesmo o processo criminal, nesse sentido, constitui palco das chamadas “cerimônias degradantes”, porque tem por definição e objeto a apuração da acusação de um fato ou ato que, por ser crime em tese, é, ainda nesse condição hipotética, sempre abjeto do ponto de vista do seu significado ético e social.

Assim, a par de atingir, em potência, o status libertatis do cidadão, atinge-lhe, em ato, sobretudo o status dignitatis.

Este desonroso significado ético e social é ainda o substrato da concepção, agora jurídica, segundo a qual o próprio ordenamento considera a mera pendência de processo criminal como coação ou constrangimento. Por vê-lo claro, basta acarear o disposto nos arts. 647 e 648, inc. I, do Código de Processo Penal, cuja conjugação demonstra que a própria lei qualifica como coação ou constrangimento ilegal a existência de processo a que falte justa causa. Donde, a pendência de processo criminal é, também e a contrario sensu, do ponto de vista normativo, constrangimento ou coação,3 ainda quando ilegal não seja.

Desta forma, entendemos que a inobservância da autoridade policial tendenciosa a incriminar em desconformidade com os princípios legais do direito, entre eles, da não auto – incriminação, da presunção de inocência, da legalidade e, sobretudo, da publicidade, trazendo a público os fatos apurados no inquérito é o bastante para garantir ao investigado, nos termos do inciso LV do Art. 5º da CF/88 o uso do contraditório porque traz a baila preceitos democráticos os quais a carta magna fez questão de prever. Não cabendo à negativa basear-se apenas na literalidade das expressões do dispositivo, ou mesmo servir de obstáculo o simples fato de ser a investigação policial um processo ou procedimento.

Alguns doutrinadores abrigam o mesmo entendimento de que em qualquer fase da persecução criminal, seja ela na investigação preliminar ou mesmo em juízo, o princípio constitucional do contraditório deve fazer-se presente.

Seguindo essa linha de pensamento, alguns autores como Ada Pelegrini Grinover, Antonio Carlos de Araujo Cintra e Candido Rangel Dinamarco afiançam que após o indiciamento, mesmo não sendo formal este ato, e inexistindo, ainda, a acusação propriamente dita, já há uma situação de litígio, ante a confrontação do investigado com o estado acusador. Então, conforme o Art. 5º, LV da CF/88, deve-se permitir o contraditório pelas consequências causadas por este ato, causando, por óbvio, a exposição do nome do cidadão em inquérito que apura um delito, deixando sua reputação bastante fragilizada.

Em virtude da natureza constitucional do contraditório, deve ele ser observado não apenas formalmente, mas, sobretudo, pelo aspecto substancial, sendo de se considerar inconstitucionais as normas que não o respeitem de modo a permitir ao investigado o controle sobre as invasões de privacidade operadas pelo Estado.

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