Caberá ao Plenário do Supremo Tribunal Federal discutir se a prisão depois da condenação em segunda instância — e antes do trânsito em julgado — é constitucional. A 2ª Turma da corte decidiu, por unanimidade, nesta terça-feira (15/12), afetar ao Plenário um Habeas Corpus que discute a questão.
A afetação foi proposta pelo relator, ministro Teori Zavascki. De acordo com ele, a jurisprudência do Supremo diz que a prisão antes do trânsito em julgado só pode ser decretada de maneira cautelar. Portanto, a ordem de prisão não pode se basear em elementos da condenação, apenas no artigo 312 do Código de Processo Penal.
Os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes já adiantaram que concordam com a antecipação da prisão — defendida também pelo Ministério Público Federal.
O caso concreto é de um homem preso em São Paulo pelo crime de roubo circunstanciado. Em primeiro grau, foi condenado a cinco anos e quatro meses de prisão em regime inicial fechado, mas com o direito de responder em liberdade. A defesa recorreu para diminuir a pena, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo negou o pedido e determinou a cassou o direito do réu de responder em liberdade.
É contra essa decisão do TJ-SP que a defesa impetrou o HC. O pedido foi, antes, ao Superior Tribunal de Justiça, onde foi negado pelo presidente, ministro Francisco Falcão. Segundo ele, as turmas de Direito Penal do STJ entendem não ser cabível HC contra decisão de tribunal que pode ser questionada por meio de recurso especial.
No Supremo, de início, a Súmula 691 impediria o conhecimento do HC, já que ela proíbe seu uso contra decisão monocrática de relator. No entanto, até mesmo a Procuradoria-Geral da República, em parecer, pediu a superação da súmula para cassar a decisão do TJ-SP.
Para o subprocurador-geral da República, Edson Oliveira de Almeira, como o juiz de primeiro grau concedeu o direito de recorrer em liberdade, o TJ-SP, ao reformar a decisão e determinar a prisão do réu em recurso apresentado pela defesa, violou a proibição do reformatio in pejus — ou a proibição de se reformar a decisão, em recurso da defesa, para piorar a situação do réu.
Inicialmente, o ministro Teori concedeu a liminar para mandar soltar o réu. Mas depois de Agravo Regimental, o caso foi levado à Turma e, nesta terça foi decidido pelo envio do HC ao Plenário.
Ideia recorrente
A prisão antes do trânsito em julgado é tema que voltou a ficar atual muito por causa da operação “lava jato”. Depois de acusações de que a Justiça Federal estava usando a prisão preventiva como forma de antecipar a pena de suspeitos sem culpa formada, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) enviou projeto de lei para se permitir a antecipação da prisão para depois da confirmação da condenação pelo segundo grau.
Pela ideia da Ajufe, a antecipação da prisão se daria apenas para “crimes graves em concreto, como grandes desvios de dinheiro público”, como defendeu o presidente da entidade, Antonio Cesar Bochenek, em artigo publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo.
A ideia inicial de se antecipar a execução de decisões de segundo grau foi proposta pelo ministro Cezar Peluso, aposentado do STF, como forma de diminuir a demanda aos tribunais superiores. Por isso, o que ele sugeria, em Proposta de Emenda à Constituição, era que se antecipasse o trânsito em julgado das decisões judicais para depois das decisões de segunda instância.
Isso porque o inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A solução de Peluso era que os recursos especial e extraordinário (os cabíveis ao STJ e STF, respectivamente) fossem transformados em ações rescisórias, o instrumento usado para questionar decisões já transitadas em julgado.
Hoje, no entanto, a PEC foi mudada para ficar mais parecida com o que propõe a Ajufe. E por isso foi criticada alguns ministros, inclusive do Surpemo. Celso de Mello, o decano, por exemplo, já disse à ConJurconsiderar a medida “inaceitável, insuportável, um retrocesso inimaginável”. Para ele, aprovar a execução antecipada “significa extinguir a presunção de inocência”.
O ministro Marco Aurélio, vice-decano do Supremo, também é contra a proposta. “Não vejo como ter-se no campo penal uma execução que não seja definitiva, já que ninguém devolve ao absolvido a liberdade que se tenha perdido. Ele entrará com ação indenizatória contra o Estado? Temos que cuidar desse problema da máquina judiciária.