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HOMICÍDIO CULPOSO NO TRÂNSITO É PASSÍVEL DE PERDÃO JUDICIAL SE OFENSOR SOFRER SEQUELAS GRAVÍSSIMAS

Em crime de trânsito, para que seja concedido perdão judicial ao agente, em razão de trauma psicológico, é necessário que haja uma prévia relação de intimidade e afeto entre ofensor e vítima. Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar pedido de perdão feito por uma condutora.

A mulher se envolveu em acidente de carro que provocou a morte do motorista do outro veículo. Ela foi indiciada por homicídio culposo e condenada a dois anos de detenção em regime aberto. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade.

A condutora apelou da decisão, alegando que a morte da vítima se deveu a negligência médica, e invocou o perdão judicial, pois ainda sofreria sequelas físicas e morais. As duas linhas de argumentação foram afastadas, mas o tribunal de segunda instância, de ofício, reduziu a pena restritiva de direitos para um ano.

Ligação emocional

O acórdão levou em consideração o laudo médico que associou a ruptura cardíaca da vítima à ação de instrumento contundente, provocada pelo acidente. Em relação ao perdão judicial, a conclusão foi pela inexistência de provas de que a condutora tenha ficado com sequelas físicas ou psicológicas permanentes, apesar da apresentação de relatórios médicos atestando que foi submetida a medidas terapêuticas em razão do acidente. Além disso, foi destacado que a motorista sequer conhecia a vítima.

De acordo com a decisão, “é compreensível que a apelante encontre-se psicologicamente abalada, porém, para que faça jus ao perdão judicial é necessário que haja um plus no sofrimento, como aquele tipo de dor que só se experimenta pela perda daquele que nos é caro”.

No recurso ao STJ, a condutora alegou que a lei não exige ligação emocional entre autor e vítima para que seja deferido o perdão judicial, bastando demonstrar que as consequências tenham sido graves.

Interpretação razoável

O relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, disse que não vê empecilho ao perdão judicial “nos casos em que o agente do homicídio culposo – mais especificamente nas hipóteses de crime de trânsito – sofra sequelas físicas gravíssimas e permanentes, como, por exemplo (e não raro), ficar tetraplégico, em estado vegetativo ou incapacitado para o trabalho”. Mas destacou que, no caso julgado, os danos físicos não foram considerados pelo tribunal local.

“A tese definidora da não aplicação do perdão judicial recaiu, exclusivamente, na perturbação psicológica gerada na ré pela morte da vítima. Por esse motivo, não me cabe adentrar na avaliação acerca do posterior estado físico da acusada para aplicar ou deixar de aplicar o benefício em discussão”, explicou Schietti.

Em relação ao sofrimento psicológico alegado, o relator destacou que “a interpretação dada, na maior parte das vezes, é no sentido de que só sofre intensamente o réu que, de forma culposa, matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos”.

O ministro disse não questionar a veracidade do sentimento de angústia vivenciado por uma pessoa que, sem intenção, mata outra, mas destacou existir uma significativa diferença em relação à situação de quem mata um ente querido.

“Não significa dizer o que a lei não disse. O que se pretende é apenas conferir-lhe interpretação mais razoável e humana, sem jamais perder de vista o desgaste emocional (talvez perene) que sofrerá o acusado dessa espécie de delito que não conhecia a vítima. Solidarizar-se com o choque psicológico do agente não pode, por outro lado, conduzir a uma eventual banalização do instituto do perdão, o que seria, no atual cenário de violência no trânsito – que tanto se tenta combater -, no mínimo, temerário”, concluiu o relator. (criminalistas)

REsp 1455178

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

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